06 Dez 2022

Comunicado da Performart sobre os resultados provisórios dos Concursos do Programa de Apoio Sustentado 2023/2026

Exmo. Senhor Ministro da Cultura, Dr. Pedro Adão e Silva,

 

Agora que já conhecidos todos os resultados provisórios dos concursos do Programa de Apoio Sustentado 2023-2026, depois do lamentável atraso relativamente à área de Teatro, a Performart – Associação para as Artes Performativas em Portugal, que representa 64 estruturas públicas e privadas de todo o país, vem por este meio relevar alguns pontos que, no nosso entendimento, poderão merecer uma análise mais aturada.

 

Antes de mais, registamos o aumento nominal da despesa prevista no Orçamento de Estado para 2023 para a área governativa da Cultura. Mas as aparências iludem. O aumento anunciado de 23%, para €760,3 milhões, será mais corretamente analisado se expurgado dos efeitos do Plano de Recuperação e Resiliência, que será temporário, irrepetível e beneficia somente o setor público, e da RTP, que tradicionalmente não se encontrava na esfera orçamental da área de governação da Cultura. Assim, o valor do OE 23 para a Cultura é de €349,2 milhões, uma subida de €22,9 milhões face a 2022, ou seja, cerca de 7%, em linha com o aumento da despesa geral do Estado prevista para 2023 face ao previsto para 2022. Assim, não se trata de um aumento notável e situa-se mesmo abaixo da taxa de inflação atual, pelo que constitui, objetivamente, uma redução relativa do orçamento para a Cultura em Portugal. Independentemente de todas estas considerações, observa-se que o investimento do estado nesta área continua muito aquém da recomendação da UNESCO de 1% do PIB (não chega sequer a 0,5% do OE), e a nova métrica que tem sido apresentada pelo Governo, defendendo a meta de “2,5% da despesa discricionária do Estado” não só não encontra paralelo internacional, como parece propositadamente desenhada para confundir a opinião pública (2,5% > 1%, logo, melhor).

 

Saudamos o aumento dos valores previstos para o financiamento dos concursos do Programa de Apoio Sustentado 2023-2026 geridos pela Direcção-Geral das Artes, uma reivindicação de há muito do setor. Tal aumento é essencial para um tão desejado fortalecimento do sistema artístico português e vem principiar a colmatar o subfinanciamento crónico a que o setor das artes tem sido votado, tal como foi já reconhecido por este Governo em mais do que uma ocasião. No entanto, o modo como se processou este reforço orçamental, associado a uma mudança radical das condições concursais, leva a que, na prática, o Estado tenha alterado as regras a meio do concurso, não permitindo que as estruturas se adaptassem à nova distribuição financeira que privilegiou, unicamente, a modalidade quadrienal e acabou por produzir resultados desproporcionados, que não constituem o panorama exclusivamente favorável que tem sido anunciado. Este reajuste da dotação orçamental somente nos apoios quadrienais frustrou inexoravelmente as expetativas e os cálculos das estruturas que se apresentaram a concurso, criando assimetrias que não favorecem o objetivo da coesão territorial e do acesso democratizado à criação artística e fruição cultural. No nosso entendimento, este desequilíbrio tem de ser corrigido. E a única forma que se nos afigura como viável é a de uma dotação extraordinária de verbas no concurso para apoios bienais, numa proporção semelhante ao aumento que se verificou nos quadrienais, de modo a repor o peso relativo de cada uma das modalidades de apoio.

 

O pequeno aumento na dotação para o concurso para projetos pontuais que foi anunciado no dia 5.12 não deverá confundir-se com uma solução para o problema acima referido. As estruturas apresentaram-se a concurso com planos de atividades alicerçados em visões estruturadas para dois ou quatro anos, com inúmeros vetores, múltiplas valências, ramificando-se, em muitos casos, em inúmeros projetos com objetivos específicos que obedecem a linhas programáticas que requerem, efetivamente, apoios sustentados. Deste modo, fundamentalmente, os apoios a projetos pontuais não poderão nunca ser entendidos como substitutos para programas bienais. Para além disso, a situação criada levaria a uma ainda maior saturação no concurso para apoios pontuais, à medida que as estruturas que não obtiveram apoio bienal tentarão obter financiamento por esta via.

 

É de notar ainda que o número desproporcionado de candidaturas elegíveis sem acesso a financiamento na modalidade bienal representa uma perda significativa de emprego numa área de enorme precariedade laboral e, consequentemente, acabará por afetar o acesso de certas populações à fruição cultural. É certo que, sem o importante apoio estatal, inúmeros projetos artísticos que, recentemente, floresciam em territórios mais ou menos descentralizados e uma série de estruturas que se vinham fortalecendo e afirmando local, nacional e internacionalmente acabem por não conseguir sobreviver, constituindo assim uma perda irreparável para a diversidade e abrangência da oferta cultural.

 

Solicitamos assim ao Senhor Ministro da Cultura que desenvolva as diligências necessárias para dotar os concursos do Programa de Apoio Sustentado, na modalidade bienal, do valor necessário para que a proporcionalidade do sistema quadrienais / bienais não seja altamente prejudicial para estes últimos, repondo a justiça para as estruturas que se viram excluídas dos apoios bienais por não terem todos os dados no momento da candidatura. Releve-se o facto de existirem inúmeras estruturas que, concorrendo aos bienais, se viram excluídas do acesso a financiamento apesar de lhes ter sido atribuída pontuação bem superior a outras candidaturas apoiadas na modalidade quadrienal.

 

Estamos certos de que, reconhecendo os impactos negativos que resultam das situações acima referidas, o Senhor Ministro da Cultura encontrará forma de repor a justiça nos concursos do Programa de Apoio Sustentado 2023-2026.